Durante pelo menos 12 anos detestei férias. Pausas curtas ou longas. As férias eram horríveis. As férias eram alturas deprimentes. As férias eram um interregno maldito. As férias eram um castigo. Talvez se perceba melhor se eu explicar que ao longo de 12 anos eu divertia-me mais na escola do que nas férias.
Às vezes até me divertia mais na escola do que em casa.
Salvo raras excepções, férias, as grandes, significavam praia e eu nunca gostei de praia o suficiente para não me importar de ir para a praia por dias seguidos. As férias eram essas viagens diárias de cerca de 30 minutos, alguns mergulhos e muita areia, para depois voltar para casa.
Mas a grande diferença entre férias e o resto do ano, a mais importante de todas, pelo menos, era só uma. Os meus amigos mais chegados iam para a terra nas férias. Em qualquer pausa de mais de três dias, amigos e colegas iam para a terra e só voltavam quando as aulas retomavam.
Durante muito tempo, mas não todos esses 12 anos, a terra era um sítio que me levava os amigos. Embora todos parecessem entusiasmados por visitar a terra e voltassem com peripécias, presentes e fotos com família e outros amigos, os que eram da terra mas também viviam noutro sítio, a terra era o inimigo.
Quando visitei a minha terra pela primeira vez depois de ter saído, percebi que a minha terra não era verdadeiramente minha, porque eu também vinha de outra terra. Percebam melhor aqui. No fundo eu era uma sem terra, porque era de pelo menos três terras. Foi também nesta altura que começou a surgir (ou eu comecei a reparar) o típico comentário racista do "volta para a tua terra". Nunca o ouvi dirigido a mim, mas sempre foi um daqueles comentários que me deixava pensativa.
Ao longo de 12 anos, a terra passou por vários significados. Começou por ser o nome do planeta onde estamos. O terceiro a contar do sol. Depois começou a ser uma coisa individual. Aquilo que me levava amigos nas férias. Aquilo de onde vinham frutos e bolos e costumes que me eram desconhecidos.
A terra passou a ser uma coisa mais simpática quando amigos começaram a levar-me com eles nas férias. A primeira experiência foi Leiria, com uma amiga que já não se encontra entre nós, que na altura dividiu comigo o seu quarto, os seus costumes e até os seus avós. A avó dela deu-me 200 escudos, que para mim foram uma fortuna. Provei queijo da terra, presunto da terra, batatas da terra, bolos da terra.
Mesmo não gostando de férias, comecei a perceber melhor o significado de ir para a terra. Tive a sorte de conhecer várias delas, certamente quando os amigos se compadeciam da minha tristeza, e até de me apegar a sítios que nem eram meus e a familiares que nem eram os meus.
Mas depois, muitos anos depois, no dia 12 de Dezembro de 2015, enquanto as nuvens se dissipavam e pela primeira vez vi pedaços desta outra minha terra da janela do avião, a terra voltou a ser, para mim, o terceiro planeta a contar do sol. A nossa terra é onde quisermos e onde escolhermos passar o nosso tempo, afinal de contas. Por isso, para mim, a minha terra é um planeta. Gosto de ter muitas opções.
Vanessa
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