Da minha estadia de 23 semanas e meia em Goa, ou umas 3 860 horas se pensarmos que cada semana tem 168, cerca de 207 horas foram passadas a trabalhar, o que dá para aí uma semana e meia de trabalho se eu fosse uma máquina e não fizesse mais nada ou umas cinco semanas se eu respeitasse as 40 horas de trabalho por semana em vigor em Portugal (ainda assim é, certo?). Não contabilizo, é claro, o tempo passado à procura do trabalho ideal, do cliente ideal e dos temas mais interessantes nem aquele que passei a pensar no trabalho ou a planeá-lo. Também não contabilizo o tempo passado a olhar para o router para ver se o sinal de internet se despachava a mostrar o ícone verde em vez de vermelho ou o que passei a alongar o corpo depois de horas em má posição ou as mil e uma interrupções a que uma pessoa está sujeita quando não tem um escritório.
Não sou pessoa de números, mas às vezes tem de ser.
Os números não dão margem para subjectividade.
Ainda que o balanço em termos de trabalho tenha sido positivo pelo contexto da experiência, sou da opinião de que este não é um bom sítio para trabalhar. Falo concretamente de Nagoá de Vernã, onde falta a luz todos os dias (pelo menos tem sido assim no último mês), a água umas quantas vezes por mês e a internet vem aos soluços (quando vem) e é tão instável quanto a vida política em Portugal.
O futuro está no teletrabalho. Acredito mesmo que sim. São já poucas as profissões que não estão automatizadas e informatizadas. Picar o ponto já é quase uma coisa do passado. Mas aqui, aqui ainda se trata de assuntos com papéis e facturas escritas à mão (às vezes em hindi) em pedaços de papel.
No banco, as transacções são apontadas num caderno enorme. As receitas médicas são escritas em blocos de papel oferecidos por empresas farmacêuticas com um desenho que representa três refeições feito pelo médico, com uma qualquer sinalização para que saibamos em que refeição devemos tomar os medicamentos.
Mas as caixas vêm sem bula. Aí, que faz falta o papel para sabermos efeitos adversos, indicações, ingredientes, o papel não vem. Às vezes nem a uma caixa temos direito. Recebemos as carteiras de comprimidos e já vamos com sorte. Sorte mesmo é quando o farmacêutico sabe o que nos está a dar e oferece umas dicas.
As farmácias, um dos poucos serviços onde a informação está informatizada, ficam paradas quando falha a internet. Aqueles quatro ou cinco dias a semana passada em que faltou a internet devem ter sido um caos na farmácia de Pirni. É por isso que em todo o lado os comerciantes têm os fiéis cadernos.
Papel e caneta. Eu bem que sonhava, quando era mais nova, em viver de papel e caneta. Escrever. Mal sabia eu que o mundo ia evoluir de tal forma que agora me basta premir teclas para formar palavras e o calo do meu dedo do meio, no lugar onde a caneta se apoiou durante tantas horas, já quase desapareceu. Se eu agora quisesse mesmo cumprir o sonho de viver de papel e caneta vinha viver para Goa. Mas depois tinha de enviar o meu trabalho por carta. Isso implica confiar nos serviços postais indianos. Hum, não.
Vanessa
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