Todos os anos há preços que sobem, mas agora que Portugal é um país altamente turístico os preços parecem mais inflacionados. Sempre que vou a Lisboa ou a Belém ou a Sintra ou a um desses
spots da moda fico com a impressão de que também eu sou turista. Já era habitual dirigirem-me a palavra em inglês, visto que não tenho uma aparência propriamente europeia, mas agora é mais comum não só
to offer me something to buy como também essas coisas virem tabeladas como nunca antes tinha visto.
No, thank you.
Na verdade, já pouco vou a Lisboa ou a Belém ou a Sintra. Pior, há meses que não piso a calçada da capital. Entre a confusão de pessoas e de trânsito, ou os atrasos e os preços dos comboios, a inflação causada pelo turismo e consequentes menus exorbitantes, os tuk tuks, e a poluição em todos os sentidos causada pelo aglomerado populacional, não há paciência. Um país que quer agradar os outros mas descrimina quem lá vive é uma distopia digna de um daqueles romances para jovens com protagonistas destemidos.
Eu não sou um desses protagonistas. Por isso prefiro passar os tempos livres em locais mais calmos e/ou não tão turísticos. Já não sobram muitos. Há pouco tempo estive na zona da Arrifana em Aljezur. Pouco há para fazer senão praia. Mas havia mais turistas que portugueses por ali. No entanto, foi bem melhor do que sequer um passeio em qualquer local próximo da capital. Até Faro, por onde passei antes de Aljezur, estava melhor do que Lisboa. E estamos a falar do Algarve, o expoente supostamente máximo do turismo português.
Um dos locais ainda seguros para quem quer fugir da confusão provocada pela crescente invasão estrangeira são as festinhas de verão, aquelas nas terriolas onde só se chega de carro. E se o preço de preciosidades gastronómicas como o pão com chouriço já chegou aos três euros em alguns sítios, quando me lembro de ter pago no passado dois euros ou menos, as sardinhas são vendidas a preços variados que chegam aos dois euros porque os humanos ainda não sabem como tornar sustentável a sua produção e é preciso impor restrições e depois uma sardinha assada vale o mesmo que um diamante, e uma pessoa às vezes paga o mesmo que num restaurante para comer de pé em algumas destas festas, as farturas são ainda aquela coisa que me safa.
Edição: "Fartura é um bolo feito de farinha, fermento, bicarbonato de sódio, sal, açúcar, canela e água que é frito em óleo, em forma de rolo, e que normalmente se vende em feiras." Segundo a
Wikipédia.
Há anos que se vende cada fartura a um euro. O preço do pão aumenta todos os anos, mas o preço da fartura tem-se mantido para aí há 10 anos. Eu sou fã do glúten e de açúcar e de comidas fritas, o que não é lá muito
in nesta altura, mas reservo a falta de decoro e a gula para as festas, por isso é habitual encontrarem-me na fila das farturas. Antes de me verem é provável que sintam o cheiro a óleo adocicado no meu cabelo e roupa.
Mas as manobras chico-espertas do marketing também já chegaram às farturas. Desconfiada que sou, presto sempre muita atenção quando os preços se mantêm, porque normalmente o que acontece para não afugentar a clientela é a redução de produto. Nem as farturas ficaram indiferentes ao fenómeno, e infelizmente um euro compra menos fartura do que há um ano ou dois. São reduções discretas, mas que me saltam à vista. Este paradoxo da fartura que agora deixa mais fome contradiz o ditado de que não há fome que dê em fartura.
Isto aborrece-me. Vai directamente contra o meu direito a contrair diabetes e colesterol, e causa-me distúrbios psicológicos. Quando as empresas, grandes, pequenas ou minis, começam com reduções e podem justificá-lo com os níveis acrescidos de preocupação com a saúde é certo que o farão. E têm feito. E isso é jogo sujo porque, neste caso, não se mexe no direito à fartura. Não é essa a base do capitalismo?
Vanessa