segunda-feira, 31 de julho de 2017

A culpa é toda dos Millennials

Lembro-me que quando era pequena, ainda antes de entrar para a escola primária, tinha queda para a má-criação. O irónico exemplo foi em certa ocasião a minha mãe me ter chamado má-criada e eu ter respondido pronta e atrevidamente: e quem foi que me criou? Lembrei-me eu disto porque dá impressão que todas as semanas há um novo artigo a passar para os Millennials a batata quente e a culpa de ela estar quente.

Os Millennials, geração milénio, Gen Y, ou como nos quiserem chamar, são seres alimentados a tostas de abacate, o que segundo o milionário australiano Tim Gurner (que começou a carreira com um empréstimo de 34 mil dólares do avô) é a razão pela qual não conseguem comprar casa. Seja qual for o sector que esteja a morrer, a culpa é deles. Filmes, guardanapos, golfe, diamantes, restaurantes. Tudo isto e muito mais, como mostra esta lista, está em declínio por causa destes Millennials. É como se eles quisessem acabar com o mundo.

Aquelas crises que precederam a minha geração foram culpa nossa. A inflação que nos impede de ter uma vida de gente crescida também é culpa nossa, porque comemos abacate no pão e vamos ao Starbucks e vamos a concertos e viajamos e compramos engenhocas e não queremos assentar nem ter filhos. Já agora, os cursos superiores que nos venderam como quase obrigatórios para termos o que os nossos pais tiveram com a idade com que acabamos os ditos cursos são afinal só uma forma de vivermos à conta dos pais por mais uns anos.

Não só isso tudo, como a julgar pelas caixas de comentários das notícias (incluindo as de outros temas que nem têm que ver com conflitos geracionais, como concertos e índices económicos sobre a compra de gadgets) a geração milénio é também são arrogante, preguiçosa, demasiado exigente, menos inteligente, mais dependente das tecnologias, e mal-educada. Ao que eu respondo da mesma forma que quando era pequena respondi certa vez:  e quem foi que nos criou? Aqueles da geração anterior que agora os criticam, está claro. Que agora vão chamar-me arrogante. Mas pronto, sou Millennial, por isso tenho as costas largas.

Vanessa

Book Review | Waiting by Ha Jin

Set in the shadow of China's Great Proletarian Cultural Revolution, Waiting is an easy to read novel that describes the journey of Lin Kong, a doctor in the Chinese army that for 18 years tries to divorce his wife Shuyu to be able to turn official his platonic love for the nurse Manna Wu. While every year his attempts conclude in failure and Lin faces a number of setbacks, including his lack of confidence, this novel is more than a love story.

Ha Jin captures in this book the pressures of a political environment that Westerners cannot fathom, the dichotomies between the busy city life and the placid rural existence, human longing and human weakness, as well as the eternal question as to what love really means. Lin is attached to simple-minded, bound-feet Shuyu through an arranged marriage, but he yearns to be free and marry someone whom he loves, though he does not think he ever experienced true passion and I would even say he's the most passionless character I've ever read.

The story turns cruel and bleak at times, testing the main characters' patience and reason. Descriptions were minimal, though not lacking richness. They were mainly about changes in season, with broad strokes about characters and the political climate. Though interesting, I felt the story turned quickly into a satirical view on human desire and developed into an anti-climactic ending. It was an enjoyable read, nonetheless.

6/10

Where can you purchase this book?

Vanessa

quarta-feira, 26 de julho de 2017

Aos avós

Os avós sempre foram para mim míticas criaturas sobre as quais fui ouvindo falar ou sobre as quais li, mas que raramente testemunhei. Sei que os avós são aqueles anciãos que raramente estão a par de como o dinheiro funciona e que por isso oferecem notas para comprar um geladinho, ou que acham que o tempo está sempre mais frio do que realmente está e que por isso aconselham agasalho, que se preocupam constantemente e que por isso admoestam juízo. Por vezes, os seus apelidos são acompanhados de um inho ou uma inha e passam a ser o avôzinho ou a avózinha porque só avô ou só avó não alcançam significado carinhoso suficiente.

O dia dos avós sempre me passou ao lado porque quase não conheci os meus e a avó paterna, a única que sobrevive à idade, está num fuso horário totalmente diferente. Agora com as redes sociais vejo os avós dos amigos e as suas dedicatórias. Tive oportunidade de conhecer os avós de alguns amigos, que me adoptaram temporariamente como neta honorária quando ia às suas casas. Mas em grande parte vivi e vivo em grande parte vicariamente a tradição dos avós, míticas criaturas generosas, experientes e preocupadas.

Tenho também memória de fábulas, como aquela em que a avózinha foi engolida por um lobo mau e sobreviveu, ou livros, como aquele em que a Anita vai de férias com os avós, ou filmes como a Heidi. Ainda assim, os avós são para mim mais do que ficção, mas não deixam de ser criaturas míticas com um dia que lhes é dedicado precisamente por o serem. E eu, que já conheci vários avós, valorizo este dia, porque eles merecem.

Vanessa

Hoje é o dia do escritor, mas não é o meu

É frequente que quem me conhece e me apresenta a outros diga o meu nome e logo a seguir uma profissão. Que não é a minha. Em Goa alguns pensam que sou jornalista, porque já fui e a minha mãe até já levou o meu nome impresso no cabeçalho de artigos que assinei. Por outro lado, outros pensam que sou escritora.

Cheguei à conclusão que é muito mais fácil arredondar os detalhes desta forma e deixei passar. Quando me apresentam como jornalista, não desminto; quando me apresentam como escritora, não desminto. A explicação para o facto de não ser nem uma coisa nem outra implica pisar terreno instável, dar uns pulos num fosso bem fundo, e abraçar a depressão. Logo a seguir, comiseração, consternação, condescendência.

Desde que me lembro que a minha identidade está ligada à escrita. Desde bem pequena que sempre quis escrever. Mas há muito que não me sento a escrever coisas minhas excepto neste blogue, criado para apaziguar certa amargura, abastecer o desejo recalcado, desabafar quanto baste, e de modo geral não ceder à frustração.

Os meus dias são passados a escrever ideias de outros para outros, a produzir conteúdo que não posso assinar, a aperfeiçoar o que não é meu de todo, e vivo muito bem com isso. Eu queria ser escritora porque queria não deixar de aprender e, está claro, não podia andar na escola para sempre. Por isso segui o jornalismo, depois exerci-o, depois exorcizei-o, depois fiz coisas que não têm que ver com jornalismo, para agora escrever coisas que não têm que ver comigo. Mas palavras são palavras e viver das palavras é um luxo.

É muito mais fácil fazer pelos outros aquilo que não posso fazer por mim. Assim não tenho nunca de lidar com a possibilidade de não saber o que escrever, de esgotar ideias, de ter de procurar sinónimos, de pensar no que os outros pensarão quando lerem o que escrevo, e de se calhar nem sequer ter talento.

Já não sei se escrever não terá sido um ideal construído ou se foi alimentado por vocação. Sei, sim, que para se escrever tem de se ler muito e nisso sou campeã. É por isso que hoje celebro o Dia do Escritor. Não por mim, mas por aqueles que me alimentam a imaginação e me fazem temer a ideia de juntar-me a eles.

Vanessa

terça-feira, 25 de julho de 2017

Avaliação Literária | O Deus das Pequenas Coisas de Arundhati Roy

Tinha este livro na estante há anos. Não sei precisar quantos e prefiro não pensar nisso para não ter vergonha. Acontece que já o tinha tentado ler pelo menos duas vezes. Mas agora, tendo já visitado parte da Índia, tive a certeza de que ia terminar de o ler. A verdade é que ainda bem que esperei para ler O Deus das Pequenas Coisas de Arundhati Roy, porque não o conseguiria apreciar em mais nova como o apreciei agora.

O livro conta a estória de três gerações de uma família em Kerala, na Índia. A narrativa poética desfaz-se nos olhos e prende a imaginação. Pareceu-me uma estória feita de pequenas crueldades e pequenos momentos de felicidade, exorcizada de uma mente estranhamente infantil como se todas as descrições tivessem sido construídas por uma criança extremamente inteligente. Não sei de que outra forma explicar o livro.

Pareceu-me uma estória sobre muito, mas o que para mim mais se fincou foram os amores proibidos. O de Rahel e Estha, gémeos biovulares, o da sua tia-avó por um reverendo, o da sua mãe, Ammu, pelo seu pai, e mais tarde por Velutha, o do tio Chacko por uma britânica, o amor dos humanos pela ordem das castas ou pela revolução. Tudo isto sob o olhar ou sob a sombra do deus das pequenas coisas.

É um livro que exige atenção a cem porcento e, no meu caso, uma folhinha e uma caneta para não me esquecer de todas as personagens e suas ligações. Há obras que valem a pena o esforço.

Por coincidência, fui ontem à Fnac e vi que Arundhati Roy lançou um segundo romance há pouco tempo, 20 anos depois deste. The Ministry Of Utmost Happiness. O nome é muito promissor.

10/10

Vanessa

Determinantes possessivos

Tenho especial apego por artistas e com esse apego um estranho sentimento de posse. É também um misto de orgulho e obsessão. Por exemplo, Paul Auster. Depois de ter lido o Palácio da Lua em adolescente e a Trilogia de Nova Iorque já na idade adulta, passei a consumir os seus livros. Quase literalmente e durante muito tempo quase exclusivamente. Tive a sorte de me apegar a um escritor prolífero. Mais tarde conheci Auster, a esposa (também escritora) e a filha (cantora) no Lisbon & Estoril Film Festival. Não houve grande interacção, excepto este ponto alto: a filha pediu-me lume e eu não tinha. Mas respirámos todos do mesmo ar naquela noite.

Sempre que oiço alguém falar de Paul Auster ou pegar num dos seus livros numa livraria, um pequeno demónio desdenha da pessoa. Olha para ela, nem deve sequer conhecer um quinto do que Paul Auster escreveu. Provavelmente nem sabe que em Oracle Night há uma menção a cadernos azuis portugueses que uma personagem comprou ou que Auster inventou um jogo de cartas. Eu descobri-o primeiro.

Em adolescente vi o filme Drácula 2001 alugado já em DVD num clube de vídeo. Não é o supra-sumo dos filmes de terror, mas deu-me a conhecer um actor, que por acaso me tinha passado ao lado numa mini-série chamada Átila. Nasceu uma fã do actor Gerard Butler. Nos inícios da internet, inscrevi-me num fórum de fãs. Conheci algumas delas. Esperei dois anos pelo Fantasma da Ópera, sem nunca o ter ouvido cantar, sempre atenta a novidades. Passei por toda a fase de reconhecimento de uma fama crescente. De ter de o dividir com outras fãs. De ver as salas de cinema dos seus filmes crescentemente mais cheias. De o ver em êxitos de bilheteira. De ter a sensação de que eu descobri-o primeiro, antes de ser tão famoso, e lhe vi o potencial.

Também em adolescente vi Memento, de Christopher Nolan. Já me desenrascava na internet, por isso encontrei o primeiro filme e o filme a seguir ao Memento, já com actores de calibre. Eu era fã. Agora sou super-fã.  Eu descobri-o primeiro. Nolan agora é famosíssimo. Mas eu descobri-o antes do sucesso da trilogia Dark Knight.  Vi Following sem restrições. Tantas, tantas vezes. Vi Memento de trás para a frente depois de o ver de frente para trás. Agora todos os fãs de Nolan se acotovelam para ver um filme cujo trailer não mostrou quase nada porque agora todos conhecem o seu potencial. Aquele que eu reconheci em primeira-mão.

Estes são alguns dos exemplos. Pode-se dizer que o que tenho são ciúmes e um sentimento de exclusividade que não me pertence. Afinal de contas, estas e outras personalidades alimentam um público e não interessa quem foi o primeiro a chegar à fila da frente. Ainda assim, eu tenho essa sensação de posse. Mas também de orgulho. Conhecia-lhes o potencial. Agora vejo-o nos olhos dos outros. Vejo o seu impacto nas respectivas indústrias. Ainda assim sou mais ciumenta com estes homens, e também mulheres (ficam para um outro post só dedicado a elas), do que o sou com qualquer outra relação que tenha tido ou que ainda tenha.

Na minha mente de fã alucinada, eles são meus primeiro.

Vanessa

segunda-feira, 24 de julho de 2017

Excertos fantásticos e onde encontrá-los I

Frases aleatórias que fazem uma pessoa voltar atrás na leitura. Tiradas hilariantes, satíricas, profundas, interessantes, tristes, nostálgicas, curiosas. Estórias dentro de estórias que se calhar mereciam um livro próprio. Achei engraçado reunir aqui coisas deste género. São apenas uma amostra, mas merecem destaque. São pedaços de livros tirados de contexto, mas ainda assim cuidado com possíveis spoilers.

"Miss Mitten queixou-se (...) da mania de eles lerem de trás para a frente. Mandaram-nos escrever De hoje em diante não leio de trás para a frente. (...) Poucos meses depois, Miss Mitten foi atropelada por uma carrinha do leite (...) e morreu. Os gémeos viram um secreto sinal de justiça no facto de a carrinha do leite estar a fazer marcha-atrás." Em O Deus das Pequenas Coisas de Arundhati Roy.

Vanessa

Cinco meses depois

Disse a minha idade pela primeira vez. Desde que fiz 30, cinco meses passaram sem que alguém me tivesse perguntado acerca da minha idade. A semana passada veio cá a casa uma senhora fazer um inquérito e tive oportunidade de dizer que tenho 30 e de desfrutar do impacto que o número tem. A senhora bem que podia ter dito algo do género: "30? Não parece nada." Mas tudo bem. O meu prédio não tem luz automática, por isso estava escuro a maior parte do tempo e ela não conseguiu ver bem a minha cara.

Vanessa

quinta-feira, 20 de julho de 2017

Jornalixo IV

"Ser vegetariano pode fazer mal à saúde" é o título de um artigo da Sábado que se baseia neste artigo do Independent. O jornal britânico enfatizou a qualidade dos alimentos vegetarianos, referindo que doces, bebidas açucaradas, grãos refinados e batatas podem aumentar o risco de problemas cardíacos.

Os escritores da Sábado decidiram extrapolar e combinaram dois estudos sobre vegetarianismo e o impacto deste estilo de vida em relação a doenças comuns, mas provavelmente nem se aperceberam da mixórdia.

A investigadora do estudo a que provavelmente a Sábado se refere originalmente e que dá título ao artigo, Dra. Ambika Satija, explicou ao Independent: "Quando analisámos as associações de três grupos alimentares ao risco de doenças cardiovasculares, descobrimos que vegetais saudáveis estavam associados a menor riso, enquanto vegetais menos saudáveis e produtos animais estavam associados a maior risco." A Sábado decidiu citar o médico Allan Williams. Que não faz parte deste estudo em específico.

O artigo de Allan Williams foca-se no significado do vegetarianismo e seus efeitos, mas não exclusivamente em relação a doenças cardiovasculares e não com base numa experiência, mas sim na citação de outros estudos. Curiosamente, ao pesquisar a publicação American College of Cardiology com a palavra chave vegetarianismo em inglês, na publicação onde os estudos de ambos os investigadores foram divulgados os estudos aparecem um a seguir ao outro, o que provavelmente levou à confusão dos escritores da Sábado.

A conclusão de ambos os investigadores são parecidas: nem todas as dietas vegetarianas são iguais e há alimentos vegetarianos pouco saudáveis. Parece-me óbvio. Refrigerantes e batatas fritas e pizzas podem ser veganos até. Não significa que sejam saudáveis. Infelizmente, o artigo da Sábado fugiu completamente à mensagem de ambos os estudos com um título sensacionalista e um artigo, a meu ver, tendencioso.

A publicação decidiu também copiar o modelo de artigo do Independent, mas logo no lead induz em erro: "Cientistas descobriram que alguns alimentos de origem vegetal aumentam risco de desenvolver problemas cardíacos. Conheça dez celebridades que, ainda assim, deixaram de comer carne e peixe".

Isto dá a entender que estas celebridades leram os estudos em questão e mesmo assim escolheram a via supostamente menos saudável, e que eliminar peixe e carne da dieta é o que faz do vegetarianismo uma dieta pouco saudável. Ao menos na legenda das fotos a mensagem parece mais positiva em relação ao vegetarianismo do que o título. Não deixa de ser triste esta salgalhada da Sábado, que ainda por cima é da autoria de duas pessoas, não apenas uma. Seria de esperar mais atenção e rigor. Não foi o caso.


Vanessa

terça-feira, 18 de julho de 2017

Nota 10 para Jane Austen

Na comemoração do 200.º aniversário da morte de Jane Austen, a autora de Orgulho e Preconceito torna-se a primeira escritora a figurar numa nota de 10 libras lançada pelo Banco de Inglaterra, que vai entrar em circulação a 14 de Setembro. A nota contém ainda uma citação interessante de uma das personagens criadas pela escritora, a detestável Caroline Bingley. "I declare after all there is no enjoyment like reading!

Só que a personagem de Orgulho de Preconceito nem era a protagonista e esta citação foi uma das suas manobras para conquistar o famoso Mr. Darcy. Já para não dizer que não tem nada a ver com nada num mar de tantas outras citações fantásticas. A prova? A seguinte foto mostra uma caixinha, oferecida pelo meu amigo R. Este tesouro contém 100 postais, cada um deles com uma citação de Jane Austen. Todas elas mais do que dignas para figurar numa nota. Todas elas bem melhores do que a que foi escolhida.

Vanessa

Dúvidas existenciais III

Como é que as mulheres que vão experimentar vestidos com fecho às lojas de roupa fazem para subir o fecho? Chamam uma funcionária? Têm braços de Homem Elástico? Não fecham o vestido?

Fui eu comprar um vestido a uma loja e nos provadores só havia dois homens-funcionários. Lembrei-me que podia prender um alfinete a um fio de nylon ou algo do género, fechar o alfinete na anilha do zip e depois, já com o vestido colocado, subir o fecho puxando o fio. Claro que só me lembrei disto na altura de deslizar o fecho do vestido quando só havia homens-funcionários nos provadores e os meus braços me pareceram curtos.


Vanessa

terça-feira, 11 de julho de 2017

Descubra aqui como transcrever manuscritos de borla e possivelmente ajudar a trazer o fim do mundo

A Biblioteca Newberry em Chicago, nos Estados Unidas, convoca voluntários com jeito para a transcrição de documentos em inglês e latim para que ajudem a tornar acessíveis manuscritos vários, incluindo livros com textos sobre magia, bruxaria, encantação e conjuração de espíritos. Mais informações no site oficial.

Este tipo de transcrição é voluntária. É também uma forma de criar uma interacção especial entre o público e estas raras peças. Muito pessoal de meados do século 15 não queria saber da produção em massa de livros através da tipografia, e manteve viva a cultura do manuscrito, razão pela qual agora os voluntários terão de invocar o seu lado filantropo para ajudarem nesta saga. Por outro lado, coitados, esta era uma forma de não atraírem a atenção da igreja e conseguirem disseminar variantes menos prezadas da religião.

A colecção Newberry conta com o manuscrito Book of Magical Charms, um manuscrito comum (era prática na altura reunir todos os interesses num caderno, e este em especial inclui assuntos do oculto) e Cases of Conscience Concerning Evil Spirits, da autoria do Puritano Increase Mather. As transcrições serão revistas por especialistas. O intuito é deixar os livros acessíveis na internet e na própria biblioteca.

Claro que parte de mim adora a ideia. A outra parte está claramente preocupada com toda esta acessibilidade a textos com o potencial de nos fazerem ter de chamar os Caça-Fantasmas (que ainda por cima agora são mulheres). A linha que separa a convocação de espíritos e a convocação de demónios é tão ténue quanto a que separa o mundo dos vivos do dos mortos. Outro problema é estes manuscritos lidarem com coisas que se calhar são invisíveis, por isso podemos não ter noção do estrago que estamos a fazer até ser tarde.

Esperemos que os demónios do passado permaneçam no passado. Já nos chega os que temos hoje. Mas bom, se o mundo tiver que acabar, que seja com magia, não é? Accio.

Vanessa

Compêndio de respostas contra iscos de cliques I

O meu Facebook volta e meia mostra-me links para artigos que até poderiam ser interessantes, mas como são prefaciados por iscos de cliques (não se esqueça do ponto número cinco ou fique atento a estes sinais) ou só porque urgem resposta, achei que fazia um favor à humanidade se reunisse aqui toda a informação.

Não vou ler os artigos. Vou simplesmente pegar no título como mote e dar seguimento.

Os 5 motivos mais frequentes para ser despedido do Dinheiro Vivo (ainda por cima é uma fotogaleria, ou aquilo a que chamo uma orgia de cliques).

Um. A empresa é portuguesa. 

Dois. Não há dinheiro (pleonasmo, se atendermos ao primeiro ponto).

Três. A pessoa é incompetente.

Quatro. O patrão não gosta na pessoa ou tem uma cunha à espera.

Cinco. O patrão chegou à conclusão que pode pôr um estagiário naquela posição.

Claro que os meus pontos são uma compilação da minha experiência (com a excepção daquilo de ser incompetente). Indubitavelmente, a razão foi quase sempre uma variante da segunda. Não há dinheiro. Nunca há. Numa das empresas onde trabalhei havia dinheiro de sobra para investir no departamento onde trabalhava, mas na semana seguinte já não havia e eu fui o elo mais fraco. Noutra, houve dinheiro para uma viagem de team building para todos os trabalhadores. Um mês depois não havia dinheiro para me terem lá. Se bem que nunca fui despedida. Simplesmente apenas não me renovaram o contrato. Desculpem lá o azedume. Juntei o útil ao agradável: fiz pouco de um artigo, já que não posso ser jornalista neste país, e ainda aliviei as azias do passado.

Vanessa

segunda-feira, 10 de julho de 2017

Não dei a outra face

O meu tom de pele roça o caramelo e o camelo, mas com um toque amadeirado e uma nuance de mousse de chocolate. No que toca a escolher um cosmético para uniformizar esta estória toda, o caso complica-se, portanto. Quando a minha secretária se transforma em toucador, mais parece na verdade uma mesa de laboratório, porque tenho de e prefiro fazer as minhas próprias mistelas combinações. Tudo isto porque a bem dizer, o intuito é sempre parecer que o esforço foi mínimo e que saltei da cama para a rua com um rosto fresco.

Entretanto estou a cerca de duas semanas para ser madrinha pela segunda vez e decidi comprar um creme bê-bê, mas cheguei a uma loja Kiko e como até creme cê-cê havia (que raios é isto?) fiquei baralhada e pus-me a experimentar várias, mas fiquei confusa e a senhora perguntou-me se precisava de ajuda, e então perguntei se ela achava que o produto em questão me iria assentar bem, e ela disse que não, por isso peguei noutro.

Ela pega numa amostra, retira uma gota de creme, tudo isto em milissegundos, e antes que eu tivesse tempo de reagir, coloca-me aquilo na bochecha e toca de espalhar. Quem me conhece sabe que não gosto dessas confianças e gosto menos ainda que me toquem na cara, especialmente se não me perguntam primeiro se não me importo. Mas não me desviei nem fui mal-educada. Não só isso, como trouxe o produto, que aquilo tinha mesmo um tom caramelo e o camelo, mas com um toque amadeirado e uma nuance de mousse de chocolate, apesar de dizer na embalagem que era neutro e ter um número ao lado. No entanto, pode não ter sido nada assim e o produto pode ser uma porcaria, porque na verdade ainda nem o experimentei no rosto todo.

Continuo frustrada porque a senhora tinha uma plaquinha na mama esquerda a dizer que estava em formação e eu devia ter dito que não se toca nas pessoas sem pedir permissão, e ainda por cima oportunidades não faltaram, porque foi a mesma senhora que me aviou o pedido. Enquanto pensava nisto tudo, lembrei-me das lições de catequese, quando se dizia que temos de dar a outra face, e lembrei-me que vou ser madrinha.

Está bem que temos de dar a outra face, e neste caso devia mesmo ter dado para ver se o produto se adequa às circunstâncias da minha aparência, mas nem uma face nem a outra daria mesmo que me tivesse lembrado do cristianismo e das implicações de ter de dar um exemplo cristão a uma criança. Sou a modos que uma cristã selectiva. Mas como normalmente chego a ser agressiva quando invadem a minha zona de conforto e não fui nada agressiva com a senhora, considero a ausência de uma chapada um acto muito cristão neste caso.

Vanessa

quinta-feira, 6 de julho de 2017

Os 10 mais lidos de Junho de 2017

A culpa é do ar

Já descobri por que razão não tenho muita sorte em geral. Um exemplo aqui

Fui a uma daquelas lojas com coisas místicas, como incenso, Budas, cristais, e até sabonetes, os mesmos que se vendem no Celeiro (vá-se lá entender). São o meu local preferido para comprar velas, estas lojas, porque sai sempre de lá alguma pérola. Já tive quem me lesse a aura (é púrpura, sinal de criatividade e misticismo), quem me dissesse que a minha alma data centenas de anos, quem me perguntasse se sou pianista (está perto, só que o meu teclado não solta ruídos muito musicais), e até quem previsse que ia chover num dia de sol (aconteceu).

Não sou de atribuir muito significado ao que dizem as velas ou às suas cores. Normalmente sou atraída pelo aroma, pelo formato, e acima de tudo pelo preço. Nesta loja em particular há muitas velas. A senhora tenta sempre explicar a que se destinam as cores e às vezes tenta que eu leve daquelas velas que também estão à venda nas lojas dos chineses, com rótulos como "Abre Caminhos" e "Sorte no Amor" e "Afasta o Mau Olhado".

Eu dessas compro nas lojas dos chineses porque são mais baratas, por isso optei por uma das outras, com umas cores genéricas. Por alguma razão e apesar de já frequentar esta loja há uns anos, assim muito de vez em quando, a lojista decide explicar-me que a vela, azul que era, tinha como intuito trazer tranquilidade e prosperidade, mas que para funcionar eu tinha de declarar a minha prece antes de a acender e depois não a podia apagar, muito menos com um sopro. A vela deveria arder até ao fim para cumprir a prece.

Pelos vistos, não só o sopro afasta o que a vela representa, como pode trazer distúrbios do foro espiritual. What?! Estas coisas deviam vir a vermelho e letras caixa alta no rótulo de todas as velas místicas. Em toda a minha vida, sempre apaguei com um sopro as velas, todas elas, até aquelas que prometem abrir caminhos e sorte no amor e afastar o mau olhado (apesar de não acreditar, são velas baratas e cheirosas, e se atraem coisas boas, por que não?), e só agora soube disto. Não admira que tenha azar no geral. Aliás, não sei como ainda não morri.

Quiçá conseguirei reverter todos estes anos de más práticas espirituais. Perdoem-me deuses, anjos, arcanjos, seres extraterrestres, sobrenaturais no geral. Nunca mais contaminarei as vossas boas vibrações com o ar proveniente dos meus pulmões. Agora preciso de encontrar uma vela para reverter o mal feito.

Vanessa